Os dados e documentos que mostram que o PSL pagou por serviços para campanha de Bolsonaro em 2018

Notas fiscais e contratos anexados à prestação de contas da executiva nacional do PSL de 2018 revelam que algumas despesas de campanha de Jair Bolsonaro foram pagas pelo fundo partidário da sigla. Foram identificados pelo Vortex R$ 915,4 mil em valores repassados a cinco empresas, que relataram serviços prestados ao comitê da eleição presidencial no segundo semestre do ano.

21 out 2019, 10:55 Tempo de leitura: 7 minutos, 8 segundos
Os dados e documentos que mostram que o PSL pagou por serviços para campanha de Bolsonaro em 2018
Foto: Mauro Pimentel/AFP

Notas fiscais e contratos anexados à prestação de contas da executiva nacional do PSL de 2018 revelam que algumas despesas de campanha de Jair Bolsonaro foram pagas pelo fundo partidário da sigla. Foram identificados pelo Vortex R$ 915,4 mil em valores repassados a cinco empresas, que relataram serviços prestados ao comitê da eleição presidencial no segundo semestre do ano. As descrições dos valores pagos constam como gastos ordinários, e não como despesas eleitorais.  


Organizamos essas tabelas em nosso próprio banco de dados, a fim de produzir as consultas e filtros desejados. As prestações de conta da campanha de Jair Bolsonaro podem ser encontradas no site do TSE.

Contas do PSL

Veja abaixo um resumo dos contratos analisados, links com os documentos e as respostas das empresas citadas.


IDEIA MARKETING DIGITAL

Valor pago pelo PSLR$ 65,4 mil
Consta na prestação de contas
eleitorais de Jair Bolsonaro
Não
Consta em doações de recursos estimáveis
feitas pelo partido à campanha presidencial
Não

A Ideia Marketing tem como único sócio Érico Filipe de Mello e Costa, assessor da família Bolsonaro na Câmara dos Deputados durante 14 anos. A empresa foi aberta menos de um mês depois de ele deixar o cargo que ocupou no gabinete de Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) de 2016 a 2018. Antes disso, trabalhou por quase 11 anos no gabinete de Jair Bolsonaro, de novembro de 2004 a março de 2016.

O que fez para a campanha de Bolsonaro:

  1. Criação e registro do site da campanha presidencial www.jairbolsonaro17.com.br;
  2. Dono da empresa, Érico Costa afirma que criou e manteve bancos de dados de apoiadores de Jair Bolsonaro. Em um dos relatórios, conta que usou como fonte a página oficial do presidente no Facebook e conseguiu angariar informações de “mais de 100 mil cadastrados para o uso de marketing digital para a campanha política em todo o Brasil”;
  3. Ele relata que disparou mensagens de WhatsApp “para grupos de apoiadores em todo o Brasil” com vídeos de Jair Bolsonaro. Também diz que esse serviço (sic) “foi utilizado, principalmente, para convocar nossos apoiadores para participar de nossa campanha presidencial, onde, nosso candidato à presidência não podia continuar na campanha por ter tido um atentado contra sua vida. O resultado foi surpreendente, várias carreatas e passeatas por todo o estado foi mobilizado usando esse serviço”.
  4. Nos primeiros dias do segundo turno, em 6 de outubro, disse que reforçaria seu trabalho com o WhatsApp, visto como prioridade para seu “objetivo, eleger Jair Bolsonaro”.

Érico foi procurado pelo Vortex, tanto no endereço da empresa — um prédio em uma área comercial de Sobradinho, distante cerca de 20 quilômetros do centro de Brasília — quanto por telefone. Ele não quis comentar a prestação de serviços à campanha de Bolsonaro. 

Documentos sobre Ideia
Documentos sobre Ideia (2)
Documentos sobre Ideia (3)
Documentos sobre Ideia (4)
Documentos sobre Ideia (5)

MOSQUETEIROS FILMES LTDA.

Valor pago pelo PSLR$ 70 mil
Consta na prestação de contas
eleitorais de Jair Bolsonaro
Sim
(valor R$ 135 mil)
Consta em doações de recursos estimáveis
feitas pelo partido à campanha presidencial
Não

Está registrada em nome de Maria das Neves Dias e Gabriel Salles, filho de Lucas Salles, que se descreveu como “marquetólogo” da campanha presidencial de Bolsonaro. O endereço declarado à Receita Federal é em Petrolina (PE), mas uma reportagem da revista Época, publicada em 2018, mostrou que a empresa, na verdade, funcionava em uma sala de outra empresa de Lucas Salles, a 9ideia, sediada em João Pessoa (PB).

O que fez para a campanha de Bolsonaro:

  1. Produziu o jingle “Muda Brasil”, tema da campanha presidencial, com verba paga pelo PSL. A primeira cláusula do contrato da Mosqueteiros com o partido, assinado na pré-campanha, diz o seguinte: “A produtora musical e artística supervisionará e coordenará, sob orientação do PSL, a produção executiva e artística do fonograma musical provisoriamente intitulado ‘Muda Brasil’, que integrará a Campanha Eleitoral à Presidência da República do pré-candidato Jair Messias Bolsonaro”.

Lucas Salles afirmou que coordenou a comunicação oficial da pré-campanha e da campanha até o primeiro turno da eleição. Sobre a criação do jingle “Muda Brasil” —pago à Mosqueteiros Filmes e de que diz ser o autor —, respondeu que “o serviço de produção foi recebido pela Mosqueteiros; o da parte intelectual, da campanha, foi recebida pela LCL Salles”.

Íntegra da resposta
Documentos sobre Mosqueteiros

LCL SALLES

Valor pago pelo PSLR$ 50 mil
Consta na prestação de contas
eleitorais de Jair Bolsonaro
Sim
(valor R$ 15 mil)
Consta em doações de recursos estimáveis
feitas pelo partido à campanha presidencial
Não

A microempresa está registrada em nome de Lucas Salles, que se apresentou como “marquetólogo” da campanha de Jair Bolsonaro em entrevista à revista Veja.

O que fez para a campanha de Bolsonaro:

  1. O contrato com o partido diz que ele seria o responsável pela identidade visual dos pré-candidatos e pelo material visual da convenção nacional do PSL, com destaque para Bolsonaro. Salles, porém, diz que foi o responsável pelo conceito e pelo jingle “Muda Brasil”, tema oficial de campanha de Jair Bolsonaro. 

Questionado sobre qual serviço prestou para o PSL e qual prestou à campanha presidencial, Lucas Salles respondeu: “[Para o] PSL fizemos trabalho na pré-campanha e para a campanha: o clipe oficial, as vinhetas ‘Dia 07 é 17’, os vídeos de 8” [segundos] do Jair Bolsonaro, inserções de 30” [segundos]. A nossa equipe acompanhava JB pelo Brasil, estava inclusive em Juiz de Fora [onde o presidente foi vítima de uma facada durante a disputa eleitoral, em setembro de 2018]”.

Íntegra da resposta
Documentos sobre LCL
Documentos sobre LCL (2)

AM4 BRASIL INTELIGÊNCIA DIGITAL

Valor pago pelo PSLR$ 480 mil
Consta na prestação de contas
eleitorais de Jair Bolsonaro
Sim
(valor R$ 650 mil)
Consta em doações de recursos estimáveis
feitas pelo partido à campanha presidencial
Não

A agência foi a principal responsável pela estratégia digital de Bolsonaro durante a campanha e responde, junto com a chapa, a ações por disparos ilegais de WhatsApp nas eleições — a empresa e a campanha negam quaisquer irregularidades. 

O que fez para a campanha de Bolsonaro:

  1. Em um relatório com serviços apresentado ao partido descrevendo atividades de 1º a 31 de outubro, durante a campanha, a AM4 declara a “programação e desenvolvimento de layout para site da candidatura majoritária nacional”, isto é, a candidatura de Jair Bolsonaro. Também afirma que gerenciou a plataforma “MaisQueVoto”, uma vaquinha virtual, e o aplicativo Voluntários da Pátria, ambos registrados em documentos de atividade entregues ao partido.  
  2. Na loja de aplicativos Google Play, o Voluntários da Pátria ainda aparece creditado à AM4 Brasil e é descrito como “aplicativo oficial da campanha de Jair Bolsonaro – 17, candidato à Presidência da República nas eleições de 2018 pelo Partido Social Liberal (PSL)”.

A AM4 afirmou que as atividades que prestou ao PSL foram “direcionadas estritamente às necessidades do partido, exatamente conforme estipulado e firmado em contrato”, e não em benefício de um político específico. Segundo a empresa, a imagem do candidato à Presidência, assim como outros de forte expressão, foram utilizadas para promover a sigla. Também disse que os serviços relacionados à campanha de Jair Bolsonaro foram “integralmente custeados por recursos advindos de doação popular”.

Íntegra da resposta
Íntegra da resposta (2)
Documentos sobre AM4

J E J MARKETING PARTICIPAÇÕES LTDA.

Valor pago pelo PSLR$ 250 mil
Consta na prestação de contas
eleitorais de Jair Bolsonaro
Não
Consta em doações de recursos estimáveis
feitas pelo partido à campanha presidencial
Não

O que fez para a campanha de Bolsonaro:

  1. O contrato do partido com a empresa durou, segundo os documentos, até 19 de agosto — três dias após o início oficial da campanha. Na descrição dos serviços, a empresa fala em “criação de música tema para a campanha”, produção de 20 vídeos e acompanhamento de cinegrafistas em viagens de Bolsonaro (dizem tanto “pré-candidato” como “candidato”). 

Procurada pelo Vortex, a empresa disse apenas que entregou todo o material que produziu ao PSL aos cuidados de Gustavo Bebianno. Não respondeu especificamente às perguntas da reportagem sobre datas de prestação de serviço nem esclareceu o que entregou para a campanha e para a pré-campanha.

Íntegra da resposta
Documentos sobre J e J

Fonte: Vortex Media – Gabriela Sá Pessoa, Wilson Lima, Teo Cury, Lucas Lago – Colaborou Rodolfo Almeida.